Autor: Luis Osvaldo Grossman
Um certo ar de desagravo pairou entre representantes da indústria brasileira de equipamentos de defesa na semana passada, quando o setor organizou em Brasília sua segunda feira nacional e demonstrou ao principal comprador, o governo, parte do que os fabricantes do país são capazes de atender.
Embora o vistoso blindado Guarani tenha ocupado lugar de destaque, também se alojaram na Base Aérea da capital alguns dos expoentes brasileiros em tecnologia e uma cerca convergência de análise: o país não tem noção do que os fabricantes nacionais produzem.
“Com Kryptus, Xmobot e Bluepex faço o projeto que a Petrobras quiser”, bradava o vice-almirante Carlos Afonso Gambôa, dando voz a uma resposta atravessada na garganta das firmas brasileiras desde que a presidente da maior empresa do país disse, no Congresso Nacional, que precisa contratar estrangeiros.
Com a divulgação de que informações da Petrobras sobre os novos campos de petróleo no Pré-Sal foram ‘interceptadas’ pelos americanos, Maria das Graças Foster esteve na CPI da Espionagem para revelar que a resiliência da estatal está nos serviços de criptografia fornecidos por três empresas dos EUA.
“Não conheço empresa nacional que possa fazer o trabalho dessas três empresas, que possa suportar esse banco de Petrobras”, disse ela. “Torcemos para que essas empresas [do Brasil] tenham algoritmos comercializáveis e que em um futuro, que não sei se próximo ou se médio prazo, poderão nos atender.”
Foi um banho de água gelada para empresas como as citadas pelo vice-almirante no evento promovido pela Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança, Abimde. “Foi lamentável”, resumiu o diretor comercial da Kryptus, Luis Campos.
“Talvez não haja uma empresa específica para atender 100% dos requisitos da Petrobras, mas com certeza um grupo de duas ou três empresas nacionais seria capaz de atendê-los. Existe muita competência e capacidade operacional nas áreas de segurança entre empresas de pequeno e médio porte”, diz ele.
Como destaca o coronel Armando Lemos, diretor técnico da Abimde, “há muito desconhecimento das capacidades nacionais”. O próprio setor está apenas começando a se articular, admite. Esse é apenas o segundo ano em que parte delas se reúne nessa feira de demonstração realizada em Brasília.
A Kryptus é responsável pela criptografia de comunicações do sistema de defesa das fronteiras e está no projeto que desenvolve a comunicação entre aviões-caça brasileiros. A Xmobot fabrica aviões não tripulados. E Bluepex fez o primeiro antivírus 100% nacional, que é usado pelas Forças Armadas.
Mas se existe uma excelência nacional, o próprio setor reconhece dificuldades. “Há uma questão de escala. Pode muito bem acontecer de um importante comprador querer uma solução imediata, mas aqui essa solução precisaria ser desenvolvida, sob medida. Uma grande empresa global pode ter isso pronto, de prateleira”, diz Lemos.
Além disso, como diz Campos, “Alguns fatores que fazem que um tomador de decisões opte por soluções importadas. A primeira é a de responsabilização, já que seguir e comprar de um dado líder de mercado blinda o tomador de decisões em caso de falhas. A segunda é cultural e na linha do ‘importado é melhor’”.
Paralelamente, atores desse campo também reclamam que mesmo com a efervescência causada pelas denúncias de espionagem indiscriminada dos Estados Unidos, o governo não teria tomado medidas práticas para mitigar as fragilidades na segurança da informação.
“Já começamos, mas leva tempo e exige recursos”, argumenta o ministro da Defesa, Celso Amorim, ele mesmo o primeiro integrante do primeiro escalão do governo a admitir a falta de autonomia nacional, especialmente nas redes de telecomunicações do país. “O primeiro passo é identificar o problema. E temos competência em eletrônica, em informação”, completa.
Para Amorim, porém, não há motivos nem para otimismo, nem para entreguismo. “Há os que acham que está tudo bem. Há os que acham que estamos muito atrasados. Não é um nem outro. Mas se nós não comprarmos nosso próprio produto, ninguém mais vai querer”, conclui o ministro.
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Fonte: Convergência Digital
Sergio Cabette • Nem tudo está perdido.
ainda temos pessoas de brio, responsabilidade, honradez e acima de tudo brasilidade.
KBT
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